*Eduardo Pragmácio Filho
A população de Fortaleza sofre o problema da mobilidade urbana, diante da greve dos trabalhadores em transportes rodoviários. A negociação coletiva ainda não logrou êxito porque há o impasse em relação ao percentual de reajuste do salário da categoria profissional. Os empresários ofereceram 5,5%, enquanto que os trabalhadores pretendem 33%, segundo notícia a mídia local.
A greve é um direito fundamental dos trabalhadores, consagrado no artigo 9º da Constituição. Em se tratando de transporte público, uma atividade essencial definida na Lei 7.783/89, a paralisação observa todos os requisitos e limites legais como: a frustração da negociação, a autorização assemblear, a notificação prévia de 72h e inclusive da população, bem como estão sendo garantidos os serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.
O exemplo do movimento dos motoristas e cobradores de Fortaleza provoca algumas reflexões sobre a aplicação da cláusula geral da boa-fé nas negociações coletivas, pois os entes que negociam têm o dever de negociar com boa-fé, em via de mão dupla, o que implica o dever de informar e o dever de veicular propostas razoáveis e justificadas.
Os empresários têm o dever de abrir suas contas e planilhas de custos, para justificar o percentual oferecido. Por outro lado, os representantes da categoria profissional têm o dever de sigilo sobre tais informações. Além disso, a boa-fé implica que as partes apresentem propostas viáveis e justificadas, caso contrário subentende-se que o dever de negociar foi quebrado, configurando-se conduta anti-sindical, passível até de indenização.
O dever de negociar se revela também no fim do Poder Normativo da Justiça do Trabalho, pois com alteração, em 2004, da redação do §2º do artigo 114 da Constituição, as partes só podem ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica se estiverem de comum acordo. Em outras palavras, ou as partes negociam à exaustão, o que não significa necessariamente firmar um acordo ou convenção coletiva, ou, diante do impasse, vão para a greve, até se chegar ou não a uma solução.
Quem deve solucionar o conflito coletivo, então, são os próprios envolvidos, estimulados pela nova ordem constitucional democrática. O dissídio coletivo ajuizado unilateralmente por uma parte que negocia, assim, não tem espaço na arena democrática. Já é hora de se largar a muleta do Poder Normativo, caminhando-se rumo a uma verdadeira postura de boa-fé nas negociações coletivas.
* Eduardo Pragmácio Filho é mestrando em Direito do Trabalho pela PUC-SP, sócio de Furtado, Pragmácio Filho & Advogados Associados e professor da Faculdade Farias Brito - pragmacio.filho@furtadopragmacio.com.br
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